Acordo do Século de Trump e Netanyahu para a Palestina legitima Apartheid
Por CSP Conlutas
Na última terça-feira (28), o presidente norte-americano Donald Trump e o premiê israelense Benjamin Netanyahu anunciaram o chamado “Acordo do Século”.
A ação teve forte apelo midiático, assim como quando ocorreu, em 1993, durante os Acordos de Oslo intermediados por Bill Clinton, com o registro do momento selado com apertos de mãos entre Yasser Arafat, presidente da OLP (Organização para a Libertação da Pelstina) e Yitzhak Rabin, primeiro ministro de Israel.
Desta vez, descaradamente, o tratado foi encaminhado de maneira unilateral, sendo realizado sem a presença do outro ator envolvido no conflito, ou seja, uma representação palestina. Ainda que para os palestinos não se deva considerar qualquer acordo com estas duas figuras políticas, a ação, que prevê, em realidade, mais avanço do plano sionista de colonização da Palestina histórica, não deveria ser aceita pela comunidade internacional.
Isso porque o que se viu ao longo dos anos, nesse processo histórico de limpeza étnica, foi a evolução colonialista na região. O estado ocupante de Israel seguiu sedento por anexações, ligando territórios entravados por obstáculos controlados por Israel. E diante disso, é necessário resistir.
Até mesmo as organizações conciliadoras, de pouca representatividade com o povo palestino, demonstraram repúdio ao acordo. O presidente da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas, afirmou que da parte dos palestinos “não existirá nenhum tipo de relação com vocês (os israelenses) nem com os Estados Unidos, nem sequer em termos de segurança, à luz do plano americano que viola os acordos de Oslo”.
Lobos em pele de cordeiro – De maneira falsamente generosa, Trump e Netanyahu anunciaram garantir um Estado Palestino com mais de o dobro do território atual, mas não reconheceram o roubo de terras ao longo da história em que planos sionistas se materializaram na fundação do estado de Israel, ocupando e expulsando milhões de palestinos de suas casas.
Além disso, o acordo ignora qualquer direito à soberania ao proibir um estado com exército e força aérea, embora isso ainda não significaria igualdade de forças contra o estado ocupante. Outro ponto extremamente ofensivo é a determinação de Jerusalém como capital indivisível de Israel.
Medidas que confrontam leis internacionais e a Organização das Nações Unidas.
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São um povo que exige justiça e luta pelo direito ao retorno. Que enfrenta a ocupação e o cerco militar e que, novamente, antes de qualquer justiça histórica ou política ser apresentada, ainda é colocado em um verdadeiro tabuleiro de negócios, organizado pelos estados que o oprimem e matam.
Não há paz garantida por inimigos – É sabido que o governo dos Estados Unidos sempre apoiou Israel em seu projeto colonialista e racista. E há anos o governo de Trump vem refirmando isso com medidas abertamente solidárias aos planos de Israel. Desde 2017, por exemplo, o presidente norte-americano vem anunciando publicamente os objetivos de estreitamento político com Israel. Chegou a declarar Jerusalém como a capital israelense, retirando sua embaixada de Tel-Aviv e causando a fúria de palestinos.
O Departamento de Estado dos EUA também passou a considerar legais os assentamentos na Cisjordânia, e Trump, que nunca se colocou contrário ao processo israelense criminoso de colonização e de anexação de terras e assentamentos, reconheceu a soberania de Israel sobre a região ocupada das colinas de Golã.
Além disso, em 2018 o governo Trump cortou verba de 300 milhões de dólares destinados à UNRWA – braço da ONU de assistência a refugiados palestinos – por considerar que os fundos eram destinados para uma “operação irremediavelmente fracassada”. Os cortes afetaram inclusive os setores da saúde e educação.
Com isso, há de se imaginar que os palestinos então se perguntem: como um governo que negligencia assistência a um povo com mais de cinco milhões de refugiados – somente nos países árabes – pode representar ou oferecer qualquer tipo de paz para esse mesmo povo negligenciado?
Estes acordos, que podem ser considerados um fracasso do ponto de vista do que se propõem a ser, são um verdadeiro sucesso para a manutenção da ocupação criminosa na Palestina. E isso ocorre desde muito antes da participação dos Estados Unidos como mediadores no conflito e agora parece seguir com o apoio de países árabes que buscam fortalecer um movimento político estratégico da aliança do Golfo contra o Irã e de outros que simplesmente decidem apoiar o governo Trump em troca de ganho financeiro e para evitar isolamento político e econômico na região.
Problemas domésticos – Além disso, a atual campanha com verniz pacífico de péssima qualidade, resolve questões internas tanto para Trump como para Netanyahu, ambos governos com crescente desgaste político
A parlamentar do congresso norte-americano palestina Rashida Tlaib comentou que “é conveniente que o plano de Trump e Netanyahu seja lançado em meio a um processo de impeachment do presidente e no mesmo dia em que Netanyahu é indiciado por corrupção. Esse jogo político não nos coloca próximos de justiça ou de paz. Como membro do Congresso, considero o projeto fadado ao fracasso”.
A jornalista brasileiro-palestina e ativista Soraya Misleh reforça esse contexto interno de ambos governos, e considera “este acordo uma afronta aos palestinos”, uma vez que “Trump usa a causa palestina para desviar a atenção para o julgamento de impeachment em curso no Senado, assim como seu aliado Netanyahu, para os crimes de corrupção”.
E alerta: “Ao mesmo tempo, num desprezo total e explícito desta vez aos palestinos, apresenta essa proposta indecente do tal acordo sem a presença de palestinos, uma legitimação do apartheid, colonização e limpeza étnica contínuas e aceleradas na Palestina, extrapolando inclusive o que é considerado inaceitável perante a ONU e o direito internacional”.
Estado único – Além de ser injusta e desconsiderar leis internacionais e os palestinos refugiados de 1948 que têm o direito de retorno às suas terras, a solução proposta de dois estados, sob o controle de Israel, além de ser insustentável se revela uma verdadeira chancela a um governo racista e discriminatório.
No mapa proposto no acordo, observa-se a criação de anexações que contribuirão para mais restrições de mobilidade, de acesso ao trabalho e de soberania alimentar e acesso à água, por exemplo.
Por tudo isso, historiadores, sociólogos e ativistas defendem que a solução para a questão palestina se dá pela via do Estado único, laico e democrático, e isso só é possível por meio de um caminho: a justiça.
Para alcançá-la, portanto, os meios jamais serão os de colaboração econômica – entre potências imperialistas, fascistas, capitalistas, etnocráticas – ou com a criação de dois Estados, uma vez que o que existe na Palestina ocupada é uma relação desigual de poder, com extrema repressão, discriminação e violência, características próprias do regime de apartheid.
“Diante disso, é preciso cessar todas as ilusões, parar de falar em paz, quando não passa de paz dos cemitérios, e fortalecer a solidariedade internacional para que haja justiça, contemplando a totalidade do povo palestino, ao que é inegociável o retorno dos milhões de refugiados as terras de onde foram expulsos a partir da Nakba (a catástrofe com a criação do Estado de Israel em 1948)”, defende Soraya.
Ato de apoio – Em São Paulo, na próxima quinta-feira (6), às 17h, um ato de apoio aos palestinos será realizado por diversos movimentos sociais. O protesto “Não ao Acordo do Século – Palestina não está a venda” acontecerá em frente à Câmara de Comércio Árabe Brasileira, na Avenida Paulista.
Soraya destaca que “é urgente fortalecer campanhas centrais como a de BDS e, em lugar do acordo, enfatizar a proposta alternativa de uma Palestina laica, livre, democrática, não racista, do rio ao mar”.
Para a CSP-Conlutas, um processo de paz só poderá ocorrer no campo político, com o fim do governo sionista e de sua ocupação e o direito de retorno do povo palestino às suas terras.
Os EUA podem querer dar início, com apoio de potências árabes, a um novo processo de resolução para a questão Israel-Palestina. Mas a história nos mostra que, sem justiça, não há paz. E que os palestinos seguirão resistindo.